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quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Oçeiro

- Afasto-me não é de tu, mas destes teus pensamentos mórbidos! Um bater de porta ensurdeceu-o, a seguir, as mesma imanências, de quem desejou por este intento ir-se embora a mulher; por sinal, a única distração a lhe restar, pois em sobre os últimos dias, desempregado e melindrado em solidão, confundia os dias pelas noites e as tardes o compunham uma tal sinfonia de conjecturações, e por tanto tempo ía entregue a elas, não mais sabia decerto somente ao agulhar de devaneios quem para si era a imagem da contemplação na qual virou-se-lhe o presídio de sua existência.

Então, completamente só, aturdido por vozes projetadas à sua inda tácita consciência, fechou-se o convívio, o qual de pessoa para pessoa é serventia, num de si para consigo; que é pasmidão. O sujeito, em conter as horas dilatadas a um breviário onde escritos vão, além de colóquios tresloucados com as paredes nuas, as enlouçadas experiências de um movimento quebradiço da cognição, respondera de intuito à necessidade com que quer a lucidez como precisa de uma atitude, em redobrar ao ócio uma intenção nada dissimulada de nele permanecer.

Ora, idas já tinha quase todas cousas; materiais, nem se fala; insubstanciais, uma ou duas ali se ficavam; entre elas, um certo apreço pela solitude, em encantar-se como a uma ode quem a absorve em sua leitura, ou, feito o deleite num sopro acarinhado da brisa um prisioneiro acabado por escapar à jaula para o mundo; mesmíssimo prazer concorde com a partida da esposa a quem aturou o companheirismo mas, por jamais entender tal preciosismo, em fuga meneara-lhe este adeus.

Não tinha prole; obtusos liames conquanto para si reais em nevruras compunham-lhe o quadro de retratos da família.

De passeio, a outorgação à maluquice de colecionar momentos sós. Almas sem corpo em o rodarem num regozijo recalcitrante, disparidades profícuas dos termos mortais; conhecimento do além da matéria com o qual dividia os instantes presentes de reflexão - prevalecendo sobre muitas outras distintas razões, a que (talvez por demais) a humanidade tem aparatado como algo valioso demasiado para viver como sem tê-las; às tais servindo apenas em valores de moral tão obsequieira a ponto de beirar algo tangente à vaidade. À si portanto um passatempo bobo para quem o mundo não está preparado senão apenas sob a face da discórdia por onde vêem-se virtudes falsas privilegiadas em detrimento de uma mônada universal e para onde o olhar deveria ser mais cuidadoso: o ócio.

Sobremaneira acostumado aos sobejos do tédio e do desprazer, da inutilidade fundamental da filosofia e dos limites baratos à verdade; se-lhas opunham, entretanto, envergando uma potencial vontade de permanecer partícipe nisso, querer, entanto, alvissareiro e fugidio, remediado pela imanência prosaica do saber-se, por alheio, um privilegiado, algo lúdico o acolhendo neste rememorar e esquecer a cada segundo quem a si passa por constante; em todo caso, a arte de permanecer de nada à nada, guarda entremeado um bom e natural consolo, a saber, espiar o universo com maior honestidade; haja visto este emérito detentor da ociosidade, à impensável voluptuosidade de sua criação, haver aí um dedo do Nada mais absoluto; portanto, um dedo seu!

E, sim.

Sim, não fora ao ato da procura de haver aí esta estupenda revelação, mas ao fato de ter-se por uma vez mais despedido do trabalho de agir em que tornou-se ele mesmo o pensamento bravio que a tanto dera ordem; e por quanto se-lhe ficou.

Pedro Costa

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