Um Dia de Pintura

Cobre-se uma linha
Da ranhura da parede
Com uma mão de tinta
Bege de baunilha
Passo o tempo inteiro
Vendo o serviço
Sua transformação

Noutro lado há o vizinho
Que reclama como tem
De reclamar
De cousa qualquer
Parecendo incomodado
Com o trato dado
Na minha casa

Realço ao funcionário
Faça isso, faça aquilo
Deixa dessa,
Obedeça!
Quem te paga o trabalho
Sou eu mesmo
Obedeça!

O que me sobra,
Mundo vão na janela
Tem jeito de ouvinte
Sabedor do que se passa
Aqui dentro de casa
Ainda sua vida
Seja toda outra

Na peleja deixo solto
O proletário
Faz o teu trabalho
Que vou a um cigarro
Fumo, fumaça entra
E incomoda o danado
Fungando feito viço
Deixa disso!

A confusão que tá
Rapaz, a casa
Virou de ponta cabeça
E eu olho o serviço
Tem de ser bem feito
Outro modo, não pago
Não pago mesmo
Não pago não!

Fuço que vou dar
No feito um palpite
Digo do que penso
Não vem, não insiste
Diz-me o trabalhador
Mas, não tou pagando?
Obedece, desgraçado!

Até que de pronto
Vai-se tomando jeito
A parede lisa em bege
Ao cômodo todo rege
Até beleza alguma
Vê como fica?
O funcionário diz
Trabalha, desgraçado
Eu digo ao funcionário.

Que aí vai um quadro
Para dous motivos:
O primeiro é cobrir
Esta ranhura feia
Depois, é colorir;
Dar vida à casa
Acho que vai servir...

Fumo outro cigarro,
Mas quando volto
Tudo errado!
Pintou onde não era
Pra pintar!
Errou a mão,
Tu me paga: faz de novo!
Faz não? Eu faço!

De pronto, pincel na mão
Né assim? Eu mesmo faço!
Cubro certinho,
Seguindo a ranhura
Do teto até o chão
Terminou:
Viu? Assim que se faz!

Foi embora.
Dei o pagamento
Vi-me satisfeito
De contentamento
Casa minha faço eu
Pra mostrar a todos
O serviço é o troco
Do que vão me pagar

E quando me mudar
Daqui, pois nada é eterno
Vou pedir ao novo interno
Não cubra esta ranhura
Pois deu muito trabalho
Pintar do chão ao assoalho
Um dia de pintura!

Pedro Costa